domingo, 3 de julho de 2016

Trabalho Final

UnB - Universidade de Brasília
FCI – Faculdade de Ciência da Informação
Curso de Arquivologia - 5º Semestre
Prof.: André Ancona Lopez



Documento arquivístico do SNI, 
à época da Ditadura Militar de 1964 – contextualização –
Diplomática e Tipologia Documental aplicadas





Anderson Roberto Pamplona Gomide – 14/0035184
Isaac Fernandes Souza - 14/0067671
José Maria Ramos de Moraes - 11/0014421
Patrick Aguiar Pereira – 14/0048986



Brasília
2016



Relatório da Oficina Presencial


Semana passada foi o grande dia, a tão aguardada apresentação de nossa oficina, gratidão aos que nos prestigiaram, deram apoio, incentivaram, um grande agradecimento aos grupos que criaram uma psicosfera agradável, de ajuda mútua. 

Roteiro da apresentação:
  • Breve explicação sobre o curso de Arquivologia, sobre a Diplomática e Tipologia documental;
  • Explanação sobre alguns acontecimentos do período da ditadura brasileira (1964-1985);
  • Falado sobre o cineasta Glauber Rocha, visto que o documento analisado na oficina fazia referência a ele;
  • Foi feita a análise Diplomática e Tipológica do documento escolhido pelo grupo:
    • Características externas e internas (elementos extrínsecos e intrínsecos);
    • Sinais de validação presentes no documento;
    • Datas tópica e cronológica;
    • Conteúdo;
    • Tramitação;
    • Contexto da produção do documento (prova de que atividade? Qual a vinculação administrativa?);
    • O tipo documental (espécie + função). 
  • Localizado o documento no tempo e no espaço, ou seja, no Fundo SNI, e finalmente, o Fundo SNI no Arquivo Nacional.
      
Oficina Queima de Arquivo


Oficina "em ação"

 

Nós somos o grupo Queima de Arquivo, estamos no 5° período do curso de Arquivologia, nossa oficina foi desenvolvida no decorrer das disciplinas Diplomática e Tipologia documental e Arquivo Permanente.


Antes de mais nada, você conhece o curso de Arquivologia? Não, não é Arqueologia! Então, de forma bem sintética a Arquivologia se dedica aos princípios e técnicas a serem observados na produção, organização, preservação, utilização e guarda dos documentos.


Na Diplomática é estudada a estrutura formal e a autenticidade dos documentos. Através dos elementos formais, o documento é caracterizado de acordo com as funções a que se destina (espécie documental).

Enquanto a Tipologia Documental aprofunda esta análise na direção da gênese documental, e da contextualização a partir das atribuições, competências, funções e atividades da entidade produtora/acumuladora (sim, as instituições também recebem documentos e os guarda – arquiva – como prova de suas atividades). As características de um documento, tanto intrínsecas quanto extrínsecas, e sua contextualização são de suma importância para entender a função do mesmo no meio em que está inserido.


(As explicações do contexto, tramitação e referentes ao arquivamento permanente encontram-se disponibilizadas à frente de forma detalhada)


Explicações sobre o documento avaliado pelo Queima de Arquivo

Uma vez analisado o documento, ao final, gostaríamos que nos avaliassem e dessem sugestões. 

Como a avaliação foi nota 10, estamos agradecidos, pois este documento nos interessa muito e será destinado ao arquivamento, porém, nos casos de notas abaixo disso os documentos são queimados, incinerados, na frente de todos.


Ficha de avaliação que nos interessa
Ficha de avaliação não “interessante”
A ideia foi que o visitante associasse, de forma natural, a incineração de documentos ao nome título escolhido pelo grupo, para o Blog e para a oficina, Queima de Arquivo.


Sobre a oficina

Ocorreu no ICC Norte, vulgo CEUBINHO, no dia 17 de junho de 2016. Foi a hora da verdade, o momento de dividir com os transeuntes um pouco do conhecimento construído durante todo um semestre de aulas e atividades.

Com a proposta feita pelo professor de escolhermos um documento e trabalhar nosso conhecimento baseado nele, nossa tarefa foi esmiuçá-lo de forma que ficasse claro aos que se interessassem em nos ouvir, de maneira interativa, aspectos e características analisadas através do referencial da Diplomática em conjunto com a Tipologia Documental.

Nossa apresentação analisou um documento da época da ditadura, resultante do acompanhamento, por parte dos militares, das atividades (consideradas "subversivas") do cineasta Glauber Rocha. Mostramos as análises que serão expostas à frente.


Visitantes preenchendo a ficha de avaliação

Queimamos literalmente fichas de avaliação que criticassem nosso trabalho, ou que pelo menos não nos qualificava de forma satisfatória. Destruir aquilo que não interessa, faz com que a informação seja perdida e jamais recuperada, assim como acontece nos casos de queima de arquivo! 

A destruição intencional de documentos constitui artifício comumente utilizado para deturpação da verdade histórica e para ocultar crimes de toda natureza; podendo ocorrer de forma concomitante, ou não, o assassinato de testemunhas.

Se não nos interessa, vira queima de arquivo!!!



Análise Diplomática e Tipológica Documental do documento "alvo":

Denominação: INFORMAÇÃO 062/DIS-COMZAE-4
Definição: Relatório produzido por ocasião do "Aniversário do Cine Clube Glauber Rocha" pelo 4o. Comando de Zona Aérea da Aeronáutica, Divisão de Informações de Segurança.

Gênero: Textual
Suporte: Papel
Formato: Folha Avulsa
Forma: Original
Fundo: SNI
Entidade Custodiadora: Arquivo Nacional

Série: "Informação" dos órgãos da repressão do Regime Militar de 1964 (SNI e DOPS).
Produtor/titular: SNI
Emissor: MINISTÉRIO DA AERONÁUTICA IV ZONA AÉREA DIVISÃO DE INFORMAÇÃO
Data cronológica: 1 de fevereiro de 1974
Data tópica: São Paulo
Sinais de validação:
Assinaturas, datação, Carimbos diversos: CONFIDENCIAL - MIN. AERONÁUTICA/DIS - ARQUIVE-SE - Protocolo (nº 789)

Função administrativa: informar as "atividades subversivas" de Glauber Rocha.
Função arquivística: demonstrar o “modus operandi” dos órgãos de repressão da ditadura militar de 1964.

Elementos externos
Conteúdo externo: Textual
Linguagem: descritiva, investigativa
Sinais especiais: CONFIDENCIAL, Advertência
Selo: Carimbo da DIS e assinaturas COMZAE-4 e DOPS
Anotações: À DEL ESPECIALIZADA DE OS E SI, Protocolo no. 789  e ARQUIVE-SE.

Elementos internos
Protocolo inicial:
"Esta DIS tomou conhecimento e divulga a seguinte informação"
Origem: SNI/APA
Difusão: CECES/SP - PMESP
Difusão anterior: EMAER-INAER-COMCAR-COMGER ...
Referência: INFORMAÇÃO 52/CISA (29/01/74)

Conteúdo interno: 
Destacando-se:
"No BRASIL, o cineasta GLAUBER ROCHA é citado como o principal utilizador das técnicas de JEAN-LUC GODARD. ... mensagens subversivas, tais como: mensagens justapostas, dissociação, sobrecarga sensorial, fragmentação, corte descontínuo, etc.

A campanha difamatória engendrada no exterior, contra o nosso país ... Os fatos narrados nos referidos filmes, mesmo referindo-se a outros países, são agressões indiretas ao regime político brasileiro de Março de 1964.
... as Embaixadas brasileiras na França e Itália, alertadas pelo Itamarati, pressionaram ... com o intuíto (sic) de proibirem a projeção dos mesmos, o que não foi feito.

... está aumentando o número de seguidores de Godard ou do CINEMA POLÍTICO, buscando dilacerar os princípios éticos do povo e, mais ainda, desmoralizar os governos democráticos, promovendo a subversão e o comunismo. O filme político, através de técnicas minuciosamente estudadas, tem como fim precípuo influenciar a opinião pública, destruindo psicologicamente o espectador, GLAUBER ROCHA e seus seguidores no Brasil, querem implantar o cinema político, para com isso enganar o povo e levá-lo à agitação, à desordem política e à revolução."

Protocolo final: Não contém


A história da nossa oficina foi reescrita adaptando-se aos nossos moldes


Trâmite

Foi acessada a cópia do documento analisado através do Projeto Memórias Reveladas do Arquivo Nacional. A documentação difundida pelo projeto não é considerada arquivística, trata-se de uma coleção formada de cópias fornecidas pela Comissão Nacional da Verdade.

Ao contrário do que comumente se acredita, o Produtor Arquivístico (Entidade) não é quem emitiu o documento e sim a organização que decide arquivá-lo como prova de atividade, estabelecida por uma função atribuída a esse mesmo órgão. O Produtor também não é o DOPS, por este ser subordinado administrativamente e não possuir autonomia (financeira e decisória), ou seja, não poderia existir um acervo do Fundo DOPS-SP.

O documento foi emitido por agente da Divisão de Informações de Segurança (DIS) do 4o. Comando de Zona Aérea da Aeronáutica  (COMZAE-4). Após tramitação interna (Ministério da Aeronáutica) foi destinado ao DOPS-SP, órgão subordinado ao SNI. 


Recolhimento ao Arquivo Permanente
 
O documento emitido pelo Ministério da Aeronáutica, passou pelo DOPS-SP e foi arquivado, provavelmente, em forma de Dossiê sobre Glauber Rocha, no acervo arquivístico do SNI.
 
O Fundo SNI foi fechado, o que, nos Arquivos, acontece quando uma organização é extinta e deixa de produzir/acumular novos documentos. O documento original tem sua organicidade garantida quando o mesmo é mantido em seu Fundo de Arquivo e foi o que aconteceu. 

Uma vez identificado o fundo, o que em Arquivologia chamamos de proveniência, qual a razão para este e outros documentos do SNI estarem arquivados no Arquivo Nacional ? 

Este Fundo está custodiado no Arquivo Nacional, órgão governamental responsável pela gestão do patrimônio documental do país, o que inclui, como no exemplo, a guarda deste fundo arquivístico.
                          

Conclusão:
"De um lado, a Diplomática tende a individualizar cada documento, enquanto a Arquivologia busca a inserção de cada documento em conjuntos mais amplos, caracterizados pelas atividades que os produziram (as séries). Tais especificidades, que distinguem essas disciplinas, ao mesmo tempo, as tornam complementares."
(Lopez, 2012)

“A Tipologia Documental é a ampliação da Diplomática em direção à gênese documental, perseguindo a contextualização nas atribuições, competências, funções e atividades da entidade geradora/acumuladora."
(BELLOTTO, 2002)

Vencida mais da metade da graduação, ficou claro que ainda existia muito o que aprendermos. Persistia a dificuldade para entender, desde os conceitos mais básicos, como suporte, gênero, formato, espécie; aos mais complexos como fundo, documento arquivístico, função/atividade, organicidade/contexto, Código de Classificação.

Quando fomos confrontados a realizar uma primeira análise sobre documentos não convencionais, ou até mesmo, um convencional como um cartão-postal ou uma carta (correspondência não é espécie!), não nos sentimos seguros em identificá-lo e quanto mais a identificar a tipologia dos documentos ou elaborar um instrumento como o Plano de classificação. Nem mesmo a diferenciação entre acervos de coleção e acervo arquivístico não nos era clara.

Foi um árido caminho percorrido este semestre em que, primeiramente, descobrimos que conceitos arquivísticos básicos ainda não haviam sido entendidos, de verdade, como ferramental a ser utilizado em toda a nossa futura atividade profissional.
Aprender a aplicar, de forma robusta, nosso conhecimento nas atividades arquivísticas, que devem englobar desde a produção documental até o seu arquivamento permanente, passando por classificação e avaliação era o desafio.
Utilizamos ferramentas não convencionais, como a internet e a estrutura proporcionada pelas TICs (Tecnologias da informação e comunicação), através de Blogs para vencê-lo. Isto nos obrigou a sair da zona de conforto de trabalhos usuais, com pesquisas simples em sites de busca e artigos.

Uma discussão interessante que logo se sobressaiu e não se encerrará nesta disciplina, foi sobre o elemento gênero dos documentos. Constatou-se que classificações como “textual, tridimensional, fotográfico, digital, eletrônico”, mostravam-se ineficientes. Portanto esse conceito carece de um estudo aprofundado para realmente atender às necessidades de análise e identificação dos documentos contemporâneos.

A identificação do fundo, proveniência, função demanda estudo mais paciente e aprofundado. Demonstrando ser tarefa complexa e, porque não, fundamental para que o arquivista consiga classificar corretamente os documentos e garantir a sua posterior recuperação, o objetivo principal do trabalho arquivístico.

O ineditismo da disciplina ficou por conta dos estudos de autenticidade e veracidade dos documentos. O estudo diplomático, dos sinais de validação e o contexto foram debatidos. Foi demonstrada a forma como a diplomática pode influir a história quando desvenda fraudes e pode esclarecer desvios intencionais e boatos.
Os estudos de Duranti complementaram e mostraram o longo caminho a frente, a ser percorrido, devido às peculiaridades dos documentos contemporâneos (ou não convencionais).

As comparações com outros planos e a análise tipológica dos documentos arquivísticos, capacitou-nos a tecer críticas mais robustas ao Plano de Classificação "atividades-meio" do Conarq e entender porque não é eficiente. 
Como citado no próprio plano:
"No código de classificação, as funções, atividades, espécies e tipos documentais genericamente denominados assuntos, encontram-se hierarquicamente distribuídos de acordo com as funções e atividades desempenhadas pelo órgão. Em outras palavras, os assuntos recebem códigos numéricos ...".
Ficou, então, caracterizado o plano, como Temático, ou seja, utiliza classificação por assunto, o que o torna ambíguo e de difícil aplicação prática.

Utilizamos, novamente, o “Mapeamento de Processos” com ferramenta BPM (Business Process Model), no caso o bizagi. Desta vez, analisando o fluxo documental e verificando que é possível apontar alguma ineficiência no trâmite dos documentos e sua contextualização na atividade em que está inserido. A representação visual dos processos facilita eliminarmos algumas redundâncias ou cópias desnecessárias, por exemplo.

Finalmente, a realização de uma oficina, aberta ao público, para demonstrarmos o conteúdo aprendido e o passarmos às pessoas, sem nenhum conhecimento prévio de Arquivologia, nos tornou capazes e confiantes para enfrentarmos os próximos desafios que hão de vir.

Referências:

BELLOTTO, Heloísa Liberalli. Como fazer análise diplomática e análise tipológica de documento de arquivo.  São Paulo: IMESP/ARQ-SP, 2002. (projeto Como Fazer, 8)

DURANTI, Luciana. Registros documentais contemporâneos como provas de ação. Trad. Adelina Novaes e Cruz.  Estudos históricos.  Rio de Janeiro, v.7, n.13, p.49-64, jan./jun. 1994.
_____. Diplomática: novos usos para uma antiga ciência (parte V). acervo, rio de janeiro, v. 28, n.1, p. 196-215, jan./jun. 2015

LOPEZ, André Porto Ancona. IDENTIFICAÇÃO DE TIPOLOGIAS DOCUMENTAIS EM ACERVOS DOS TRABALHADORES pg. 15-31, 2012.
em MARQUES, Antonio José e Stampa, Inez Terezinha. Arquivos do Mundo dos Trabalhadores, Coletânea do 2o Seminário Internacional O Mundo dos Trabalhadores e seus Arquivos: Memória e Resistência





Conarq – Resolução 14


Projeto Memórias Reveladas do Arquivo Nacional